No paraíso, tudo que Adão e Eva viam lembravam a Deus, viam a beleza da criação, o poder do Senhor e o glorificavam e exultavam. Até mesmo os seus corpos, que estavam nus, não os atraía para o mal; quando os viam, pensavam na beleza da criação divina. Contudo, após comerem o fruto proibido e assim terem cometido o pecado original, esconderam-se, pois agora, sua visão havia sido maculada e o que antes viam e os lembrava de Deus, agora olhavam e apenas viam prazer carnal, e isso os atraía de um modo que esqueciam do Senhor.
Santo Agostinho criou uma história que expressa bem isso: havia um noivo que presenteou sua amada com um lindo anel, com a intenção de que, sempre que ela olhasse o presente, lembrasse dele. A jovem se agradou tanto do objeto que não conseguia parar de olhar para ele; sentava-se no sofá e passava horas e horas a admirá-lo. No dia seguinte, o noivo vai até a casa da amada, e quando a empregada diz que o amado chegou, ela, ainda hipnotizada pela beleza do anel, diz que deve avisar que ela não está em casa. A jovem havia se atraído de tal maneira pelo objeto que havia se esquecido do seu real amor. Assim, o anel, que deveria lembrá-la do seu amado, agora havia se tornado objeto de adultério, traição.
Assim também é possível ver no primeiro livro da trilogia O Senhor dos Anéis. O pequeno Sméagol (um hobbit comum) vivia tranquilamente até que encontra um anel perdido no rio. Desde o primeiro instante, o objeto o atrai tanto que o leva a matar o seu amigo para que este não lhe tire o objeto. Ele se apaixona pela beleza e poder do anel de tal forma que se torna uma obsessão. Aos seus olhos, todos são seus inimigos e querem lhe tirar o seu “precioso”, como ele mesmo diz. Sméagol fica tão fixado ao anel que se torna monstruoso, tornando-se o que depois chamam de Gollum. Sméagol acha que o anel lhe dá poder, o torna um deus, mas, ao contrário, o anel se tornou o seu deus e Gollum o idolatra; agora ele é o seu escravo.
Ambos os exemplos trazem a mesma mensagem. Deus nos criou com a finalidade de conhecê-Lo e amá-Lo. Estar perto de Deus nos torna felizes, e estar longe nos torna infelizes. Quando cometemos um pecado mortal, viramos as costas para Deus e cometemos a nossa própria autocondenação. Afastamo-nos do nosso verdadeiro fim.
Assim, ao nos deixarmos seduzir pelo prazer e pelos ídolos, esquecemos do Criador e nos afastamos da verdadeira felicidade. O caminho de volta para a graça divina é lembrar que tudo o que temos e vemos deve nos levar a Deus, não nos afastar d’Ele. Reconhecendo a origem divina de todas as coisas, podemos reencontrar a paz e a alegria que só a proximidade com o Senhor pode proporcionar.